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  • Ala dos Compositores do Kolombolo

    Encontro com o Samba A Ala dos Compositores do Kolombolo é um encontro semanal aberto para novos e consagrados sambistas. Num clima democrático - coisa rara no samba - qualquer pessoa pode apresentar seu samba e descobrir novos diálogos com outros compositores. site do Kolombolo www.kolombolo.org.br #AladosCompositoresdoKolombolo #SãoPaulo #samba #Kolombolo

  • Eu, Poema

    Livro Eu, Poema - livro de Aline Lira Aline Lira é uma poeta autêntica. Dessas que não "dominam" a palavra, mas que "são" a própria palavra. Sua técnica não transparece. Suas rimas e não-rimas são igualmente poéticas e fluem fáceis, naturais. Seu primeiro livro é frescor, inteligente e universal. página do livro no Facebook www.facebook.com/Eu-Poema-390607860994940/?fref=ts para comprar www.martinsfontespaulista.com.br/eu-poema-424109.aspx/p #AlineLira #EuPoema #Poesia

  • As Sete Cidades do Piauí existem

    Um príncipe e uma princesa; um amor proibido entre esses filhos de dois reinos inimigos; em consequência, uma trágica guerra envolvendo os cinco reinos vizinhos é deflagrada; a tragédia é tão grande, que forças superiores, no intuito de deter o avanço da hecatombe, decidem transformar o príncipe e a princesa em lagartos que, por fim, são petrificados num quase-beijo, juntamente com todo o povo, animais e plantas de todos esses reinos, que perduram em suas poses em movimento “congeladas” em esculturas de pedra para todo o sempre. Esse é o resumo da lendária origem das Sete Cidades do Piauí. Quem nos contou essa história, com todos os detalhes, foi o Osiel, o nosso anfitrião que nos levou a passear pelo parque das Sete Cidades. Ele nasceu naquelas terras - quando aquele território ainda não havia sido transformado em parque pelo governo - e depois de adulto, tornou-se guia dos visitantes. Essa história foi contada a ele por sua avó, que por sua vez a aprendeu de sua avó. Logo percebemos que uma das riquezas das Sete Cidades é a quantidade de histórias sobre elas. O lugar é tão misterioso, encantador e mágico que, de acordo com Erich von Daniken, autor de um famoso livro, “Eram os deuses astronautas”, com teses ufológicas sobre a origem das civilizações humanas, as Sete Cidades são obra de seres extraterrestres de civilizações avançadíssimas em relação às dos terráqueos. Osiel nos conta que frequentemente acompanha ufólogos e místicos em suas pesquisas naquela região. Uma teoria sobre a existência de um caminho, que chegou a ter vários trechos pavimentados, que vai das Sete Cidades até uma cidade Maia, no México, cruzando toda a América do Sul e, por conseguinte ligando duas antigas civilizações, complementa a tese ufologista, corroborada pela coincidência de algumas figuras, entre as pinturas rupestres antiquíssimas, encontradas nos dos dois lugares. Em meio a lendas e teorias, Osiel, que tem uma mentalidade bastante científica, e se intitula “curiólogo” por profissão, nos conta que, do ponto de vista geológico, com base também na presença de fósseis, as formações rochosas do local indicam que há milhares de anos aquele lugar foi o fundo de um oceano, esculpido por correntes marítimas. Mais tarde passou a ser esculpido pelos ventos e em certo momento se transformou em território habitado por vários povos indígenas que se sucederam na região desde que existe a humanidade na América do Sul. A área do parque para visitação pública tem cerca de 490 hectares, percorrida através de um trajeto principal de 12 quilômetros. Tem muita coisa para ver. Para aproveitar bem é necessário dispor de, no mínimo, dois dias. Chegamos num sábado à noite, nos hospedamos no hotel do parque e exploramos a região durante o domingo e a segunda-feira. Ao acordarmos na primeira manhã, tomamos café na companhia de um alegre currupião amarelo e preto; um pouco mais afastados estavam o cupido, todo preto, e o cancão, preto e branco. Aqui os pássaros são atrevidos e se aproximam da gente sem cerimônia. Começamos a nossa visita pela sexta e segunda cidades: pinturas rupestres representando lagartos, mãos com espirais e formas geométricas variadas; a vista é maravilhosa, as formações rochosas, todas, sem exceção, inusitadas; Osiel vai nos direcionando a imaginação apontando para formatos de elefantes, cachorros, bois, sapos, tartarugas, esfinges, cobras, jacarés… mas vemos também animais vivos. Há peixes num lago do parque, conhecemos o mocó, um ratinho típico do lugar, vemos também cotias, urubus, gaviões e calangos de vários tipos. A vegetação é uma das coisas mais lindas e das mais diversificadas que eu já tive a oportunidade de ver nessa vida, nesse Brasil. Osiel sabe a propriedade medicinal e a utilidade da maioria das plantas que vamos encontrando pelo caminho. Enquanto vai falando sobre elas improvisa uma pulseira para mim, trançando um broto de tucum (uma palmeira local); nos mostra o pau-pombo, que além de ser útil na construção civil também é bom para o controle da diabetes, se tomarmos o chá das folhas três vezes ao dia durante 15 dias, alternando com mais 15 sem tomar. Mostra-nos o jacarandazinho, de cuja semente faz-se atualmente lindas jóias; o mesmo se dá com a resina do jatobá, usada por artesãos para moldarem figuras de bichos. Aqui há muitíssima carnaúba; algum babaçu; a árvore janaguba tem um látex que é bom para a coluna; o pau-terra tem uma flor de pétala única; a gameleira é majestosa, mas contribui para a destruição das formações rochosas; da azedinha se aproveitam as folhas, caules e frutos para curar indisposições do estômago (eu provei, é gostosa); a canoinha é uma fruta apreciada pelos papagaios e pelos artesãos; o pequizeiro é a árvore mais bela do mundo. No segundo dia alugamos uma moto para visitarmos as cinco cidades restantes. Deparamo-nos com os três reis magos; com as imagens originais que inspiraram as estátuas da ilha de Páscoa; reis, rainhas, soldados, damas, castelos, cavalos; muitas outras plantas, incluindo o murici e a flor alaranjada da bromélia espinhosa que há por ali. Finalizamos o passeio tomando banho numa bela cachoeira. Despedimo-nos de Osiel e, de noitinha, pegamos o ônibus para Piripiri para continuarmos a nossa viagem pelo Piauí, o estado brasileiro com o povo mais gentil do Brasil. Partimos pensando em voltar num futuro não muito distante para saborear melhor tudo o que experimentamos um tanto quanto rapidamente. Fotos: Walter Antunes fotos Walter Antunes para mais fotos das Sete Cidades do Piauí: https://500px.com/walterantunes/galleries/sete-cidades-do-piaui contatos com Osiel: (86) 999 590 616 (Tim) (86) 994 663 036 (Claro/Watsapp) #Katawixi #SeteCidadesdoPiauí #Piauí #WalterAntunes #LuamaSocio #OsielMonteiro #Curiólogo

  • Isso é questão de cultura

    A palavra cultura, assim como qualquer outro termo geral usado para significar uma ideia abstrata ou conceito, obviamente pode ser empregada para múltiplos significados, porém proponho uma reflexão sobre qual ideia de cultura se tem quando se usa essa palavra como um substantivo que designa algo que se pode ter ou não ter. Ter ou não ter cultura em nível individual, ter ou não ter cultura em nível social, ter ou não ter cultura em nível de política de Estado. E, num passo a mais, tentarmos perceber as relações e contradições implicadas na ideia que temos dessa questão. Dizemos que alguém tem cultura quando nos referimos a uma pessoa educada, estudada, ilustrada. Essa três condições são diferentes entre si, mas são geralmente suficientes para servirem de significado para determinar se alguém tem cultura ou não. Sobre a cultura em nível social, temos aprendido que cada grupo, comunidade, etnia, nação, tem seus próprios costumes, sistemas de símbolos, valores e formas de representação que compõem seus sinais identitários, ou seja, cada grupo tem sua própria cultura. E, politicamente, que existem, no aparelho do Estado, os departamentos, secretarias e ministérios, dentre eles o da Cultura. Associamos as atividades desse departamentos com ações governamentais de proteção e incentivo, basicamente, aos artistas e intelectuais. Isso posto, logo percebemos que o nosso indivíduo "culto" deve ser a personificação daquele construto ideal das nossas práticas escolares, oriundas dos ideais iluministas, portanto modernos, sobre os quais, como muito bem lembra o professor Alfredo Veiga, “basta pensarmos acerca de quem eram os arquitetos da Modernidade - brancos, machos, eurocêntricos, colonialistas, burgueses, eventualmente cristãos (…) para que nos demos conta das marcas que eles imprimiram ao modelo de sujeito que impuseram ao mundo”. Ao passarmos agora para a ideia de cultura relacionada ao nível da questão social, percebemos uma multiplicidade de objetos, fatos e valores contraditórios, os quais nos acostumamos abarcar sob o conceito de cultura e que, de alguma forma, “sentimos” ou imaginamos que compõem uma unidade respaldada por sua vez através de uma vaga noção de “identidade”, talvez provocada pela proximidade espacial e temporal desses elementos múltiplos. Depois de Foucault, as pessoas que pensam sobre a questão da cultura têm como alternativa conceitual estabelecer o fundamento das reflexões sobre a cultura sob o conceito de “discurso”, tal como faz Stuart Hall, que afirma que “uma cultura nacional é um discurso - um modo de construir sentidos que influencia e organiza tanto nossas ações quanto a concepção que temos de nós mesmos” (2005, p. 50). Nesse sentido então, é possível abarcar sob o conceito de cultura, uma coisa tal como o crime. Exemplo disso é a campanha feita na rede social mais utilizada pela internet dizendo “não à cultura do estupro”, ou então em nível de representação literária, num romance tal como “Mundo Perdido”, de Patrícia Melo, analisado por Glaucia Mirian Silva Vaz como um discurso que aponta para “a hipótese de relação entre a identidade do brasileiro e a criminalidade, exemplificada no trecho: Aqui no Brasil, se você quer ser alguma coisa na vida, tem que roubar, tem que ser ladrão. Todo mundo rouba.” A relação aparentemente contraditória entre esses dois sentidos de cultura - o sentido atribuído ao construto do sujeito individual e o sentido atribuído ao discurso da identidade social como representação da cultura - pode ser refletida, segundo o professor Alfredo Veiga, pela consideração de que o Iluminismo criou uma imagem “de unidade do espaço social, do sujeito, do conhecimento, da cultura, etc. (…) e que a Modernidade se articulou na busca dessa unidade, de modo que acabamos percebendo a realidade como unitária”, quando na verdade não é assim. Considerando que é impossível conceber a identidade individual fora do grupo social, o professor Alfredo Veiga escreve: “Sendo todo esse processo altamente dinâmico (…) cada indivíduo está exposto a muitas e variadas situações de interpelação, cujo resultado produz sujeitos que têm pouco a ver com aquele idealizado pelo Iluminismo - que seria o centro de uma identidade única, estável, permanente. Como explica Hall, a identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à medida que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados com uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar ao menos temporariamente”. Por sua vez, a cultura, na acepção de um elemento constitutivo da política de Estado sob a forma de um setor específico do poder executivo, surge no Brasil no período Vargas e se prolonga até os dias atuais, ora vinculando-se ao setor da Educação, ora aos interesses das corporações da indústria de entretenimento (cinema, rádio e televisão), imprensa e editoras; e ainda com o mapeamento de atividades culturais “tradicionais”; algum incentivo a produtos específicos (como a lei Rouanet); e a realização de eventos culturais de permeio. A pesquisadora Lia Calabre, da Fundação Casa de Rui Barbosa escreve, referindo-se à historicidade dessa questão até o governo FHC: “No Brasil não temos tradição de realização de estudos de políticas públicas, em especial em áreas como a da cultura. (…) Verificamos uma série de iniciativas (…) que inúmeras vezes foram abandonadas e retomadas com pequenas alterações por governos que se seguiram uns aos outros”. A partir do governo Lula parece que houve uma preocupação de incrementar e ampliar os conceitos de cultura pelo Ministério da Cultura, incluindo um esforço para diminuir o “autoritarismo” das hegemonias culturais, as quais deduz-se dos valores “iluministas” e também “liberais”. Incluiu-se uma maior diversidade cultural no âmbito do foco das ações do Estado, e também houve um esforço em direção à proteção e incentivo dos criadores de arte e de saberes. E mesmo que na prática uma maior sistematização do setor cultural pelo Estado não tenha promovido grandes avanços, em 2016 todas essas tentativas de consolidação do conceito de cultura em nível de política de Estado estão em processo de desmoronamento no contexto do “impeachment” do último presidente (Dilma Rousseff). O caso é que, de maneira geral, o senso comum identifica a questão cultural - no âmbito de políticas públicas -, com a proteção, benefício e incentivo do Estado a artistas. E como se sabe, se o conceito de recurso econômico está associado aos conceitos de necessidade e utilidade, a arte está associada - desde os inícios filosóficos de seu termo - à inutilidade. E se justamente durante o Renascimento as “artes mecânicas” tenham adquirido, aos olhares históricos, um estatuto de utilidade, por participarem do desenvolvimento de saberes relacionados às técnicas que permitiram os engenhos da modernidade, vemo-nos hoje num cenário que faz perdurar os modos artísticos renascentistas como essa arte “autoritária” e “elitista” - muitas vezes a única a ser considerada oficialmente como algo que possa ser chamado “cultura” pelo senso comum - colocada em xeque quanto à sua “utilidade”. Pois essa arte, em sua forma repetitiva nos modos renascentistas, também já se tornou obsoleta em sua utilidade técnica, embora ainda possa ser considerada desejável como instrumento educativo para as crianças. Segue-se que ainda perdura também, vagamente, essa noção da potencialidade da arte como alavanca para novas descobertas técnicas “úteis” em âmbitos diversos, mas isso não aparece claramente, nesses termos, como elemento relevante no juízo prático para se avaliar a questão da cultura em nível do senso comum. Em complemento a essa questão, a arte, sob a forma de “produto cultural” só é considerada pelo senso comum como algo de valor, quando submetida à mesma lógica de mercado que as outras mercadorias, ou seja, têm o seu valor agregado de acordo com a aceitação, promoção, divulgação e distribuição regulada pelas grandes corporações que controlam o consumo de massa. Nesse ponto agregamos o pensamento do filósofo Bauman, que diz que a cultura “se transformou de estimulante em tranquilizante; de arsenal de uma revolução moderna em repositório para a conservação de produtos”. E por outro lado, “em tempos líquido-modernos a cultura (…) é modelada para se ajustar à liberdade individual de escolha, e à responsabilidade, igualmente individual, por essa escolha”. Por ocasião de um protesto político organizado pelo Teatro Oficina reivindicando a “volta” do Ministério da Cultura, extinto pelo presidente provisório Michel Temer em Maio de 2016 (e “desextinto” alguns dias depois), a filósofa Marilena Chaui fez um bonito discurso, lembrando o sentido de “futuro” embutido no conceito de cultura. Então nos lembramos da explicação de Alfredo Bosi sobre a etimologia da palavra cultura: “podemos falar na cultura do arroz, na cultura da soja, na cultura do trigo, entendemos muito bem que é uma terra cultivada; falamos em cultivo (palavra também derivada de colo) e mais ainda, com frequência, usamos a palavra cultura na acepção ideal, que é muito rica, porque traz dentro de si, na forma verbal terminada em -ura, a ideia de futuro, de projeto”. Assim, à guisa de reflexão final, propomos pensar na questão da cultura a partir da seguinte pergunta: “o que estamos cultivando?”. Foto: Walter Antunes BAUMAN, Zygmunt. “A cultura no mundo líquido moderno”. Trad. Carlos Alberto Medeiros. Jorge Zahar Editora, 2013. BOSI, Alfredo. “A origem da palavra cultura”. https://pandugiha.wordpress.com/2008/11/24/alfredo-bosi-a-origem-da-palavra-cultura/ CALABRE, Lia. “Política Cultural no Brasil: um histórico”. www.cult.ufba.br/enecul2005/LiaCalabre.pdf FERREIRA, Rilce Maria Rocha Aguiar. “Da arte e sua utilidade”. http://revistapandorabrasil.com/revista_pandora/filosofia_34/rilce.pdf HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10 ed. Trad. de Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. RUBIM, Antonio Albino Canelas (Org.). Políticas culturais no governo Lula. http://hugoribeiro.com.br/biblioteca-digital/Politicas-culturais_governo_Lula.pdf VAZ, Glaucia Mirian Silva Vaz. “A identidade enquanto dispositivo de banalização do crime: uma análise de posições-sujeito sobre criminalidade” in MARQUES, Welisson e vários/organizadores. Michel Foucault e o Discurso: Aportes teóricos e metodológicos. Uberlância: EDUFU, 2013. VEIGA, Alfredo. “Michel Foucault e os estudos culturais”. http://www.lite.fe.unicamp.br/cursos/nt/ta5.1.htm #Katawixi #LiaCalabre #LuamaSocio #GlauciaMirianSilvaVaz #AlfredoVeigaNeto

  • Um encontro com Korda, autor da foto mais famosa do mundo

    a Arthur Monteiro Já me disseram que a foto mais reproduzida no mundo é a do quadro da Mona Lisa, e aí fico a pensar na decepção que tive quando vi o quadro de verdade, lá no Louvre. O Louvre é um museu enorme, daqueles que a gente precisa de mais de um dia para ver, cheio de quadros enormes, separados da gente apenas por uma cordinha – e quando se chega à Mona Lisa ela é um quadro pequenino em relação aos outros, e está lá no fundo de um corredor comprido, e entre ela e a gente há uma porção de paredes de vidro à prova de roubo ou ataque, que a protegem e deformam um bocado a magia dela, e na frente da gente tem tal multidão de gente tentando ver aquele quadro mais famoso do mundo que na verdade a gente vê muito pouco. Consolei-me, na ocasião, comprando um cartão postal com a foto do quadro, para levar para o hotel e olhar bem como é que era a bendita Mona Lisa. Leonardo da Vinci que me perdoe por eu não ter curtido devidamente o seu quadro. Acho, no entanto, que a foto mais conhecida no século XXI é outra: é a de um jovem argentino que, depois de formar-se em medicina, saiu a andar pela América, primeiro com uma motoquinha, e depois com uma bicicleta, e acabou participando de uma revolução que até hoje mexe com os brios de muita gente. A foto em questão, de Che Guevara, foi tirada em algum momento iluminado da vida dos dois: do fotografado e do fotografante, e está nas camisetas, botons, adesivos, agendas, e o que mais se possa imaginar de milhões de pessoas pelo mundo afora. Penso que ela já bateu o número de cópias da Mona Lisa. De Che Guevara você já ouviu falar, mas quem bateu aquela foto? É um assunto que muita gente também sabe: foi um fotógrafo cubano chamado Korda, e penso que raríssimos de vocês teve na vida a oportunidade que eu tive: a de conviver pessoalmente com o fotógrafo Korda. Korda e um grupo de outros artistas cubanos apareceram em Blumenau lá pelo outono de 1994, e o Artur Monteiro e eu fomos mais ou menos os anjos-da-guarda, ou algo assim, do alegre grupo de cubanos que achava o nosso rum e a nossa pimenta muito fracos. No grupo, entre desenhistas, fotógrafos e pintores, havia uma artista plástica chamada Lésbia, que achava totalmente natural chamar-se Lésbia, sem a menor malícia a respeito do seu nome, coisa tão comum a nossa gente brasileira. Por uns dias, esteve aqui todo o grupo; depois, os outros se foram e ficou Korda. Ah! Como lembro de Korda! Ele me parecia sempre como um alegre Profeta do Antigo Testamento, e é assim que a sua imagem ficou no meu coração e na minha mente. Artur Monteiro e eu o carregamos para todas as partes, revezando-nos. Korda, naquela altura, teria mais de sessenta anos, mas sua energia era ilimitada. Eu vivia cansada e cheia de sono de tanto acompanhar Korda, mas não perderia um instante da sua companhia por nada do mundo. Tenho uma linda foto com ele no Restaurante Tiefensee, em Blumenau, onde ele se fartou de comer cierdo. Por dois anos Korda fora o fotógrafo oficial do governo cubano, logo após a Revolução. Disse-nos, no entanto, que não tinha pique para tanto: Fidel Castro e Che Guevara dormiam duas ou três horas e já estavam prontos para outra longa jornada de trabalho, enquanto ele, Korda, precisava lá de suas oito horas de sono. Chegou um momento em que não agüentou mais: teve que pedir a conta. Mas o quanto tinha para contar daqueles amigos íntimos e pessoais que provocam reações tão desencontradas na Humanidade de hoje: há os que os amam e há os que morrem de medo deles! Por alguns dias, Korda hospedou-se na minha casa. Tenho até hoje, na minha parede, uma foto tirada por ele, revelada do negativo original, de dois jovens sem camisa pescando na transparência do mar do Caribe: Fidel e Che. Ele escreveu uma dedicatória. E um dia acabou indo-se embora, e Artur Monteiro e eu ficamos na rodoviária de Blumenau, abanando para ele dentro do ônibus. Eu sofri um bocado, na época, quando soube que Korda morreu em Paris em 2001. Ele é daquelas pessoas que a gente nunca esquece!. * Urda Alice Klueger é escritora, historiadora e doutora em Geografia. #UmencontrocomKordaoautordafotomaisfamosa #UrdaAliceKlueger #Korda #CheGuevara #AlbertoKorda #Katawixi

  • Caminhada Noturna pelo Centro

    São Paulo Iniciativa única realizada por pessoas da comunidade, semanalmente desde 2005 os participantes podem passear pelo centro de São Paulo em caminhadas com roteiros que sempre provocam descobertas históricas, arquitetônicas e culturais surpreendentes. gratuito programação www.caminhadanoturna.com.br/caminhada.htm #CaminhadaNoturnapeloCentro #CentrodeSãoPaulo #SãoPaulo

  • Amanda & Monick

    Cinema Para quem quer descobrir o Brasil. A história de Amanda & Monick em Barra de São Miguel, um documentário do diretor André da Costa Pinto, direção de fotografia, João Carlos Beltrão; direção de som, Guga Rocha; direção de arte, Carlos Mosca; direção de produção, Carol Torquato e Henrique Neto. #AmandaMonick #AndrédaCostaPinto #JoãoCarlosBeltrão #GugaRocha #CarlosMosca #CarolTorquato #HenriqueNeto #BarradeSãoMiguel #cinemabrasileiro

  • Seo Carlão do Peruche: patrimônio da cultura brasileira

    A história do Seo Carlão do Peruche se confunde com a história do samba. Nasceu em 1930 na rua Pirineus, entre a Santa Cecília, os Campos Elíseos e a Barra Funda, regiões fundamentais para a formação do samba na capital paulista. Morou também no bairro do Bixiga. Integrou a mítica escola de samba Lavapés, a mais antiga escola de samba desfilando no carnaval paulistano na atualidade. Ainda jovem participou com outros sambistas da fundação da Escola de Samba Unidos do Peruche, no bairro da Casa Verde. Grande conhecedor das origens do samba, das mágicas tradições de Pirapora do Bom Jesus, Seo Carlão é Cidadão do Samba e Embaixador do Samba de São Paulo. Participou do processo de oficialização dos desfiles de carnaval no final da década de 1960, de todas as discussões sobre os rumos do samba paulista e da pacificação entre as escolas, como presidente da Peruche, líder visionário e apaixonado pelo samba. Ritmista, partideiro, compositor, intérprete e possuidor de uma das mais claras visões sobre o samba feito em São Paulo, com 85 anos de idade, Seo Carlão do Peruche é um dos grandes baluartes do samba, importante líder e pensador. Fotos, texto e vídeo: Walter Antunes #CarlãodoPeruche #Samba #Sambapaulista #Katawixi

  • Casa Elefante

    São Paulo Excelente lugar no centro de São Paulo para pessoas à procura de novas ideias, descobertas, discos, livros, fotografia, amizades e um café. site www.facebook.com/elefante277?_rdr #CasaElefante #SãoPaulo #Livros #Discos #Ideias #Cultura #Artes

  • Mostra 20 Anos do Teatro Por Um Triz

    São Paulo A Cia Teatro Por Um Triz celebra seus 20 anos com Mostra de espetáculos no Sesc Ipiranga. Oportunidade única para se assistir peças recentes e rever montagens clássicas da Cia. link para a programação da Mostra www.sescsp.org.br/programacao/91868_MOSTRA+20+ANOS+DO+TEATRO+POR+UM+TRIZ#/content=programacao site da Cia www.teatroporumtriz.blogspot.com.br #Mostra20AnosdoTeatroPorUmTriz #TeatroPorUmTriz #SescIpiranga

  • “Eu não vou na sua casa, pra você não ir na minha!”

    “Eu não vou na sua casa, pra você não ir na minha!” Brincando com a música cantada pela minha amiga Dona Selma do Coco que fala de visitantes inconvenientes, eu gostaria de cantar, digo falar: As pessoas na pseudo-global-aldeia estão mais do que nunca se fechando em seus mundinhos, todos constróem suas verdades, criam seus guetos e clubes, suas páginas na web, seus playlists, elegem seus universos, comunidades... O que é vendido como revolução não passa de blefe: todos os avanços tecnólogicos têm servido para as pessoas estarem mais distantes umas das outras, começando pelo controle remoto da garagem, que elimina a possibilidade da conversa com o vizinho: chega-se de carro e aciona-se a entrada direta do bunker, evitando o contato com o vizinho. Então muitas páginas depois, o punk não dialoga com o novo-punk, o rap da favela não conhece o samba. E acaba que num mundo com tantas verdadezinhas pré-fabricadas inicia-se o descrédito na própria íntima-verdade e na verdade do outro. Vira regra o desrespeito por tudo que não se conhece. Não se pede aqui para ninguém viver a vida do outro, mas para se diminuir um pouquinho a altura do muro, para que se possa olhar e entender que do outro lado da rua, que no apartamento vizinho, na mesa de trabalho ao lado, que na outra mesa do restaurante, na fila do banco ou do teatro, existe vida e que esta vida é tão importante e bela quanto a vida dos olhos que estão agora olhando. Vida sendo vivida neste instante. Com os olhos verdadeiramente abertos, talvez se possa entender e apreciar tanta diversidade que explode e se recria a cada momento, por aí, nestas vidas Então tudo muda: eu vou na sua casa, pra você ir na minha! texto do livro e exposição “interiores : diversidades” de Fábio Takahashi e Walter Antunes #CotidianoLGBTT #InterioresDiversidades #DiversidadeSexual #WalterAntunes #FábioTakahashi #GADA #Katawixi

  • "A menina comilona" ou a arte de sentir arrepios transversais

    O livro “A Menina Anolimoc” (“Menina Comilona” ao contrário), de Adnavlag Queiroz Oavlag (Galvanda Queiroz Galvão ao contrário) me impactou profundamente: a profusão de imagens, a hiper-realidade, a inteligência e concepção incomuns, tudo isso me deixou fortemente impressionado. A primeira reação foi procurar paralelos, tentando encontrar outras expressões literárias ou estilos com os quais o livro pudesse dialogar, mas fui aos poucos me convencendo de que toda tentativa de aproximação com outros discursos obrigavam-me a recuos imediatos. Cheguei a inferir (indevidamente) que o livro flertasse com o nonsense ou com a narrativa fantástica, concluindo depois tratar-se de narrativa caleidoscópica, cujas imagens brotam das criações sintáticas; da disposição parelha de termos em contraste que formam oxímoros e paradoxos; do emprego polissêmico de palavras de natureza homônima, de modo a sugerir numa mesma frase mais de um sentido denotativo, efeito que amplia as possibilidades de soluções de enredo ao mesmo tempo que cada uma dessas possibilidades pode construir redes próprias de sentidos subjetivos. Chamou-me especialmente a atenção o modo como os procedimentos formais adotados agem contra a lógica da realidade empírica, pois ao mesmo tempo que atuam a favor de uma dimensão horizontal e sintagmática, própria da prosa e da informação social, possuem também aquela dimensão vertical, paradigmática, simbólica, que define a poesia. Ao propor-se como narrativa, o texto assume o compromisso de representar algo, um “como se”, por meio da ficção, compromisso que lhe empresta as feições de enredo e exige dele a devida obediência à coesão e às lógicas de um tempo e um espaço próprios. A linguagem utilizada, contudo, constrói um objeto crespo, cortante e avesso à efabulação, de modo que toda a lógica inicialmente proposta pela intenção sintagmática, acaba por sensualizar-se, desestruturando-se, numa espécie de delícia e volúpia das palavras. Desse processo, resultam os simulacros de espaço e tempo, que uma vez desestruturados, agem sobre as demais categorias narrativas, determinando-as. Isso se explica pela tensão entre as dimensões acima expostas, tensão que faz com que a linguagem ricocheteie entre a prosa e a poesia e salte da representação da realidade para a imaginação da matéria, como diria Bachelard evocando o direito de sonhar, o desejo de mais ser. (1989, 1996). As transgressões ou artifícios de invenção propostos pelo texto poder-se-ia dizer, não coadunam com a imaginação formal derivada da abstração e caracterizada pela desmaterialização e pela intangibilidade. Pelo contrário, tanto a Menina comilona, personagem, como o narrador e o escritor parecem confluir para uma mesma entidade, numa convergência para o que Wayne Booth (1980) chama de autor implícito, portando-se, enfim, como inventores da própria matéria. Para essas vozes, independentemente de se manifestarem juntas ou separadamente, tudo parece possível. Por meio da Menina se estendem “pontes sobre os muros”, se “descobre(m) sítios”, se “amplia(m) as fissuras” por onde se pode denunciar as posturas conservadoras e espiar novas possibilidades de existência. É por isso que o hiper-realismo do livro parece às vezes romper a barreira do realismo, como se dialogasse com o fantástico, já que nem a personagem, nem o narrador se incomodam se as suas ações e pontos de vista coadunam com a lógica da realidade factual. Como um palimpsesto, o texto permite sempre ver-não-ver uma escrita subjacente a ele, ampliando suas referências e possibilidades de leitura. Do conjunto de imagens resulta uma crítica equilibrada aos modos mecanicistas de produção e, ao mesmo tempo, uma mensagem de valorização a uma vivência amazônica natural – vida de água doce –, livre e clandestina. Da transgressão e experimentação linguística à fantasia excitante, tudo se encaminha para que a personagem atue como uma outra Alice, que em vez de seguir um coelho inusitado como na história de Carroll, cria ela mesma suas pontes, tentando plasmar uma nova realidade onde possa reconstruir o mundo a partir de sua planta original: a floresta, as águas, a vida. O mote do livro são as metáforas fome e comer, definidoras da personagem. São também metáforas da procura e da transformação à medida que a Menina comilona come antropofagicamente, absorvendo-observando àquilo que não conhece ou domina a fim de tomar sentido – desaprender e aprender – de todas as coisas. A sua fome, contudo, não é extensiva. Não se trata de comer muito, mas de comer profundamente: “passos, firmes, mas parcos”. Por isso, apesar de a menina comer quase tudo, não são as coisas o que ela quer, mas o sabor-saber. A sua fome, então, não é um deglutir que devora, mas um processo de esvaziamento semântico dos signos que é imediatamente preenchido por sentidos novos e inusitados. Não pretendo analisar o livro. Gostaria de fazer voltar o tempo, domá-lo se preciso, e deixá-lo seguir bem lentamente de modo a apreciar e recuperar os gestos e os silêncios. Só assim, numa conversa em que não se mede as horas ou palavras poderia mostrar a rede complexa de sentidos que percebo e que vivencio com o livro. Sem dizer, mostraria o porquê (e quanto) gostei dessa Menina comilona e como passei a desejar o livro com aquela sofreguidão de um amor clandestino. Vejo-o a todo tempo como uma insinuação, sedução e antecipação de algo que está por vir. E sinto tanta força nele, tanto engenho, que o imagino como centelha de uma centena ou mais de páginas. Quero dizer que adoraria vê-lo retomado numa narrativa mais extensa. Pode-se preservar a estrutura de conto, pode vir a ser novela, talvez romance. Sinto apenas que há energia, viço e fogo, tudo represado nele e pronto para que ele se emprenhe. A própria narradora nos dá pistas sobre isso quando lembra o Catatau, o Ulisses, a Macabéa, como se ao vê-los, visse a si mesma refletida. Veja-se que tudo lhe serve de exemplo, tudo é apanhado em sua virgindade e condensado em experiência: Devorava Alice, Carroll, Borges, Barriga, Rilke, Baudelaire, Zumbi, Dalcidio, A Senhora D, Clarice, Rosa, catatau, haikais de Leminski, frases, martelados pensamentos, pessoas, igarapés, procuras, procuras ensimesmadas, feixes. Nesse particular, A menina não esconde a sua ascendência. Seu discurso descende dessa família de centauros. Diz-se Penélope, mas não uma Penélope que espera. Uma Penélope que faz o seu próprio périplo pelo Brasil, pela Amazônia, roçando pedras, excitando águas de igarapés, fazendo jeitos para maçarandubas, dizendo eu volto: não vá. Há uma eroticidade que não é possível apanhar com o corpo, uma verve de estado amoroso, qualidades únicas de uma menina, cuja lascívia está no pulmão que engole os ventos, na pele que absorve o sol, no corpo que se banha par ter-se na agua, como fonte. Lembro, a propósito, de um poema de Carlos Drummond de Andrade (2002, p. 820-1), dedicado à Clarice Lispector, que poderia muito também ilustrar a sua personagem Menina: veio de um mistério, partiu para outro./Ficamos sem saber a essência do mistério/ Ou o mistério (...), diria, repetindo e parafraseando o poeta, é a própria menina viajando nele, pois a Menina comilona vive de ampliar as fissuras, (...), sua procura delirante, sem nome, assim, assim, diante de arbitrárias direções, salta......! Absurdos são traços moventes, (...), ela opta pelo desvão, o diverso e o mesmo, como diria Macabéa, o imponderável nas vitrines. Isso você já disse, ela me diz, peço pra ela novas impressões, ela corre enquanto chove. Molhada, sorri. Macabéa, protagonista de A hora da estrela é duplamente lembrada no texto. Citada textualmente, é lembrada também por contraste, pela linguagem e pelos paradoxos irônicos. Macabéa, diz Clarice, "Ela falava, sim, mas era extremamente muda" (1999, p. 29) e, se pensava, era para admitir que “tudo o que acontecia era porque as coisas são assim mesmo”. A menina comilona, por sua vez, quer trespassar o mundo pelo avesso, sem insulamento, sem reservas, sem dificuldades para enunciar. Seu périplo é uma forma de dar respostas aos porquês, às normas que constituem a realidade empírica. Essas respostas se dão pelos intensos fluxos de imagens capazes de esvaziar conceitos consagrados e propor novos modos de ver e sentir o mundo. Sua aventura por terras e paisagens novas só é possível porque a menina se deslumbra e enxerga o mundo como se o visse pela primeira vez. Um exercício de descoberta interior e de re/conhecimento. Eis aí um livro que não faz concessão à leitura mediana; que sabe do seu poder e não se intimida em incitar o leitor para seus desatinos. Em todo o percurso, de modo quase subliminar, a mulher é posta como “a pergunta” e “a resposta” em suspensão, tudo sintetizado nesta frase: “Pegava um espelho, contava miçangas, estrelas, sapos cururus, sonhava sem adormecer.” (p. 18). Sim, é esse estar acordado o que interessa. Esse jeito de vivenciar que reverbera e emprenha imaginação. * Osvaldo Duarte é Professor universitário, poeta e crítico literário P.S.: Como disse a certa altura, não pretendia fazer análise, mas acabei por citar algumas obras ao fluir espontâneo das ideias. Então, para adensar a conversa, relaciono abaixo os textos lembrados ou referenciados: ANDRADE, Carlos Drummond de. Visão de Clarice Lispector. In. [Discurso de Primavera e algumas sombras.]. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002. BACHELARD, Gaston. A água e os sonhos: Ensaio sobre a imaginação da matéria, São Paulo, Martins Fontes, 1989. ———. A poética do devaneio. São Paulo: Martins Fontes, 1996. BOOTH, Wayne C. A Retórica da Ficção. Lisboa: Arcádia. Trad. Maria Teresa H. Guerreiro, 1980. GALVÃO, Galvanda Queiroz. A menina comilona. Belém: Editora do Autor/Uxi.Cão. 2013, 28 p. LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1999. #AMeninaComilona #Literatura #Katawixi #NovaLiteratura #GalvandaQueirózGalvão #OsvaldoDuarte #KarloRômuloQueiróz

  • “Meu nome é Jacque” fala da maravilha que é o amor

    A história de Jacqueline Rocha Côrtes é um filme. E felizmente foi filmada. Sob o título “Meu nome é Jacque”, dirigida por Angela Zoé, a história, contada em formato documentário de 72 minutos, produzida pela Globo Filmes, foi lançada em São Paulo no dia 03 de Maio de 2016. Quando dizemos que a história de alguém é um filme, é que estamos querendo dizer que os acontecimentos narrados nos parecem tão incomuns, que mesmo sabendo que são reais, eles nos surgem como um romance fantasticamente imaginado, recheado de fatos surpreendentes. É maravilhosa a existência e a trajetória de uma mulher que nasce num corpo de homem numa família amorosa e compreensiva; na adolescência dança no grupo do famoso coreógrafo americano Lennie Dale; faz uma carreira de sucesso como docente de língua inglesa no início da vida adulta; infecta-se com o vírus da aids; descobre uma angina e coloca várias pontes de safena; encontra o grande amor de sua vida e casa-se com ele; faz a reversão cirúrgica corporal para o sexo feminino; torna-se militante das causas relacionadas aos direitos das minorias sexuais e à aids; é convidada a trabalhar no Ministério da Saúde para a implantação das políticas públicas relacionadas aos temas de seu ativismo; expande os limites das fronteiras nacionais indo trabalhar na ONU; e por fim demite-se das funções profissionais para se dedicar à criação de seus dois filhos, pois chegou a hora de realizar sua missão de mãe nessa vida. Mas apesar da singularidade dos fatos históricos da vida de Jacque, o impacto que ela nos causa se dá justamente no contraponto com a realização do fundo trivial e singelo de sua mensagem: para se viver dignamente como ser humano só é necessário amor e justiça: ensinamentos da mãe e do pai de Jacque; tão antigos como o velho e o novo testamentos da bíblia sagrada. Então a personagem Jacque nos aparece como alguém que está aqui para nos alertar sobre o fato de que, embora nos imaginemos habitantes de um universo social estável em seus códigos e linguagens, a realidade vai muito além das convenções. Posto isso, é óbvio que o amor existe justamente como a mais privilegiada das características humanas, aquela que deve prevalecer sobre quaisquer convencionalismos, aquela que nos faz compreender o mundo e as pessoas como eles realmente são, na medida da própria dinâmica da vida que se desenrola. Assim, se para qualquer mulher que nasceu num corpo feminino, é trivial ter seios, menstruação, filhos, etc., para Jacque, tudo isso aparece como algo a ser conquistado a duras penas num contexto de muito sofrimento. Tudo causado pela inadequação das pré-formatações das trocas simbólicas e biológicas entre corporalidade e identidade subjetiva, independentes da própria Jacque como pessoa. E aquilo que seria compreendido como nada trivial, ou seja, a trajetória profissional de importância e alcance inusitados e incomuns para a maioria dos mortais, aparece na vida de Jacque como consequência naturalizada do seu ser. Ou seja, aquilo que seria “natural” para os comuns, no caso de Jacque é “artificial”, e aquilo que seria “artificial” para os comuns é “natural” para Jacque. Portanto só o amor, esse estado possível de ser alcançado pela dimensão emocional humana, é capaz de fazer as pessoas compreenderem integralmente essas coisas que, apenas pelas lentes do preconceito é que se afiguram como enigmas. E esse amor permeia toda a vida de Jacque, irradiado de sua família, concentrado na própria Jacque e espalhando-se através de suas ações no decorrer de sua história. É preciso dizer ainda que Jacqueline é também uma pessoa de agudíssima inteligência. Desse tipo de inteligência que causa admiração imediata e serve de guia para todos. Tudo o que Jacqueline fala sai do centro do coração. Sua palavra é verdadeira e transparente, e por isso é agradável ouvi-la e também é impossível não se maravilhar com a exatidão e clareza de sua posição dentro de assuntos muitas vezes espinhosos que vão surgindo ao conversarmos com ela. Pelo contexto de seus discursos ela exemplifica o exercício dessa liberdade que também faz parte da caracterização dessa típica prerrogativa da especificidade humana. Mostra como o ser humano é capaz de viver a vida aproveitando todas as oportunidades para afirmar a sua liberdade intrínseca de realização individual que, no limite, é a realização do sentido da vida. No debate após a estreia do filme em São Paulo, Jacqueline agraciou a plateia com suas palavras lúcidas sobre questões diversas colocadas pelo público, dentre as quais, a atual atmosfera retrógrada que ronda as determinacões das políticas públicas relacionadas aos direitos humanos num futuro próximo e disse: “O mundo mudou. Não cabe mais a mentalidade dos Bolsonaro, Malafaia… o que eles vão fazer? Matar todo mundo? É certo que historicamente há retrocessos e avanços, mas nosso papel político é resistir sempre a esses retrocessos. Nosso lugar é na resistência.” Segundo as informações da diretora Angela Zoé, o filme “Meu nome é Jacque” não tem finalidade comercial, portanto pode ser solicitado por educadores, entidades educativas, etc., para uso pedagógico. Para fazer a solicitação é necessário enviar uma mensagem na página de divulgação do filme no facebook. O título da página é o mesmo do filme: Meu nome é Jacque. #MeuNomeéJacque #JacquelineRochaCôrtes #transexualidade #cinemanacional #globofilmes #Katawixi

  • A ciência se transformou em escrava da utilidade

    A principal referência histórica das relações entre utilidade e ciência no discurso filosófico remonta à figura do filósofo inglês Francis Bacon (1561-1626). É de se notar que essas relações estão também intimamente vinculadas à ideia de ciência moderna, manifestada principalmente através de suas qualidades materialistas e progressistas, ou seja, à ideia de ciência tal como se configura em linhas gerais no imaginário atual. Destacaremos, sobre Bacon, as seguintes afirmações: “erigiu como divisa a máxima saber é poder, pois o saber, para Bacon, é apenas um meio mais vigoroso e seguro para conquistar o poder sobre a natureza e não tem valor apenas em si mesmo; cultivava entusiasmo pela técnica; desejou que a ciência servisse à humanidade em geral; propôs a teoria da indução como base para o método científico e o método científico consiste na observação metódica e experimentação; defendeu que a harmonia e o bem-estar dos homens repousam no controle científico alcançado sobre a natureza e a conseqüente facilitação da vida em geral; vislumbrou que a ciência não é obra individual mas coletiva” (1). Não obstante as controvérsias sobre a validade ou eficácia da indução como base do método científico (2) e a sua eventual substituição pela dedução, os valores da ciência anunciados pela filosofia de Bacon seguem inalterados. E mais: a evolução desta ideia de ciência em íntima conexão com o desenvolvimento do imperialismo inglês (e hereditariamente dos EUA), de seu industrialismo, de sua economia capitalista ora denominada neoliberal, de seu modelo de civilização, fez desses valores da ciência os próprios valores da sociedade da era da propaganda, do consumismo e da massificação. Pode-se afirmar então, que tais valores que, ao que parece, nasceram de uma contestação a valores anteriores, vivem, por assim dizer, o seu apogeu na contemporaneidade. É em meio à predominância dessa mentalidade que nasce a crítica do filósofo australiano radicado nos EUA, Hugh Lacey - militante de causas ecológicas relacionadas com a tragicidade das técnicas atuais da indústria agrária -, a alguns aspectos dos valores que se tornaram senso comum sobre a ciência. Lacey tem uma vasta obra na área da Filosofia da Ciência que, basicamente, propõe a prática de uma ciência para a era da globalização sobre a base ideológica da democracia participativa, em que os projetos científicos deverão se adequar ao pluralismo de valores inerente à diversidade de contextos sociais, ecológicos e culturais existentes no planeta. Neste caso, por exemplo, nem sempre será mais útil o domínio da natureza ao invés da sua preservação. Entre as teses que Lacey propõe sobre a interação entre valores sociais e ciência, a Tese 10 expressa este pensamento nos seguintes termos: "O objetivo da ciência é bem servido pela institucionalização das práticas científicas sempre que uma pluralidade de estratégias, associadas respectivamente a diferentes valores sociais, possa ser ativamente adotada. Isso também tornaria possível uma maior manifestação da neutralidade, faria com que mais atenção fosse dada a questões de valor suscitadas por aplicações, e – acima de tudo – promoveria o fortalecimento de instituições de participação democrática" (3). A tradição científica que se segue a Bacon consolida a ideia de que a ciência é o meio principal do progresso da humanidade rumo ao bem-estar geral. E o faz através principalmente do que Lacey chama de abordagem descontextualizada dos fenômenos que trata. A visão que sustenta a abordagem descontextualizada é aquela que afirma que a ciência é em si, livre de valores, o que quer significar que a utilidade da ciência é universal porque não depende do direcionamento de interesses e desejos subjetivos porque o próprio método científico garante a objetividade. Lacey argumenta que, no entanto, a própria noção da ciência sem valores já está imbuída de valores. Estes não se evidenciam convencionalmente como valores, mas habitam o espaço da ideologia tradicional da ciência. São eles, a Imparcialidade, a Neutralidade e a Autonomia. Esses valores, que propiciam a abordagem descontextualizada, ironicamente, ao invés de terem promovido o bem-estar geral da humanidade, acabaram por mascarar, ao longo da história, inúmeros interesses políticos e econômicos de grupos específicos aos quais a ciência tem servido. Diante deste cenário, Lacey propõe alguns redimensionamentos filosóficos para a ciência da atualidade. Na perspectiva de Lacey o objetivo da ciência será mais o entendimento do que apenas o conhecimento, e a atenção à Neutralidade garantirá a consideração de uma pluralidade de estratégias necessária à diversidade de interesses sociais. Mas mesmo que racionalmente possamos pensar, juntamente com Lacey, que os níveis de utilidade do produto da técnica científica para fins de valores sociais terá de variar de acordo com o contexto social, cultural e ecológico, o comprometimento da ciência com o projeto global de desenvolvimento modernizador “representado pelas instituições e valores hegemônicos nos países industriais avançados” (4) reveste toda a sua performance com o valor da utilidade direcionada ao “crescimento econômico, industrialização, transferência de tecnologia moderna, integração à economia capitalista mundial” (5). Assim, de um certo ponto de vista, todos os produtos da ciência e da tecnociência serão úteis, atém mesmo independentemente de terem sido necessários antes de existirem, pois a ciência, atrelada aos propósitos do neoliberalismo, tornou-se o principal agente cultural dos tempos atuais. Uma consideração desta situação levará à consciência de que a própria cultura do mundo globalizado é modelada em grande parte pelos processos científicos. Por este aspecto nada será então mais útil ao mundo do que a ciência, já que ela própria figura como móvel dos modos deste próprio mundo. O senso comum é apenas coerente com este estado de coisas. Neste sentido, até mesmo o tipo de pesquisa científica que teria a pretensão da grande ciência, aquela ciência “idealista”, autônoma, movida pela curiosidade inerente ao espírito científico, que pretende apenas produzir previsão e decisão sobre os objetos mais variados, sem fins sociais aparentes, estará compondo a esfera da utilidade por se considerar ela mesma contribuindo para o progresso de um todo maior que é a própria ciência-cultura. Portanto, Lacey insiste em lembrar que a abordagem descontextualizada pode produzir ciência sem limite, mas muitas coisas ficam de fora da “linha” da abordagem. Segundo Lacey a explicação científica relaciona-se com a descrição dos fatos empíricos, porém pode também ser utilizada para confundir objetivos. Muitas vezes a explicação não aborda fatos relevantes que ficaram de fora. Escolhe-se uma coisa, ao invés de outra. Para Lacey, somente não perdendo de vista os ideais da Imparcialidade e da Neutralidade as instituições científicas terão condições de se conduzir através de uma atenção à pluralidade de estratégias, tentando superar a estreiteza dos limites da abordagem descontextualizada. Para finalizar mencionaremos o caso polêmico, no Brasil, da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. Embora cerca de 350 cientistas de todo o país tenham produzido um documento indicando desastres ecológicos, sociais e culturais irreversíveis e incomparavelmente desvantajosos para o país, do ponto de vista da sustentabilidade, em relação à possível vantagem da construção da usina, bem como a não-necessidade de um pólo gerador de energia de grandes dimensões para o local; embora o Ministério Público tenha elaborado ações jurídicas para o impedimento da obra; embora houvesse manifestações do povo, de protesto em passeatas pelas ruas das cidades do Brasil, contra a construção, a presidenta do país, juntamente com o grupo de pessoas interessadas nos lucros que a obra lhes proporcionará, seguiu firme na decisão da construção da usina. Uma ação dos mesmos moldes foi o projeto de transposição e desvio das águas do rio São Franscisco, ameaçando biodiversidades e culturas sob o conceito da sustentabilidade. Esses são alguns exemplos retirados dentre inúmeras escolhas e ações políticas desenvolvimentistas envolvendo altas tecnologias geradas por uma ciência descontextualizada, que entram em conflito com o conceito de sustentabilidade, via ausência da democracia participativa. Bibliografia BACON, Francis. Novo Organum ou Verdadeiras Indicações acerca da Interpretação da Natureza. São Paulo: Abril Cultural, 1979. LACEY, Hugh. Valores e atividade científica 1. Editora 34: São Paulo, 2008. LACEY, Hugh. Valores e atividade científica 2. Editora 34: São Paulo, 2008. POPPER, Karl. A lógica da pesquisa científica. Tradução de Leônidas Hegenberg e Octanny Silveira da Mota. São Paulo: Cultrix, 2007. SWIFT, Jonathan. Viagens de Gulliver. Tradução de Octavio Mendes Cajado. São Paulo: Publifolha, 1998. WATSON, Lyall. Onde vivem as lendas. Tradução de Luiz Corção. São Paulo: Difel, 1979. ZATERKA, Luciana. A filosofia experimental na Inglaterra do século XVII: Francis Bacon e Robert Boyle. São Paulo: Associação Editorial Humanitas: Fapesp, 2004. Notas: 1 Palavras retiradas do texto de José Aluysio Reis de Andrade sobre a Vida e Obra de Bacon na Introdução ao Novo Organum, Coleção Os Pensadores, 1979. 2 Para Popper, por exemplo, “que incoerências podem surgir facilmente, com respeito ao princípio da indução, é algo que a obra de Hume deveria ter deixado claro. (...) as várias dificuldades da Lógica Indutiva são intransponíveis. (...) conduzem a uma regressão infinita ou à doutrina do apriorismo” (pp.27-31), 2007. 3 p.30, VAC 2. 4 p. 200, VAC 1. 5 p. 200, VAC 1. #Ciênciaeutilidade #HughLacey #LuamaSocio #Valorescientíficos #CiênciaeSociedade #Katawixi

  • O hábito da leitura é uma atitude cultural libertária

    Ficar absorto na leitura é diferente de ficar espalhado entre várias janelas ao mesmo tempo no computador. O livro torna visível um esforço de concentração que todos sabem ser experiência saudável ao ser humano de todas as idades. A atitude de ler é identificada com a prática de recolhimento, de sustentação do foco de atenção. Uma vez ouvi o escritor de livros infanto-juvenis, Dionisio Jacob, responder a seguinte coisa a uma adolescente do oitavo ano que lhe perguntou o que fazer para aprender a gostar de ler: “o momento da leitura é um momento só seu. Quietinha, com o livro na mão você está vivendo um momento íntimo, sem mais ninguém interferindo. Quando você aprender a gostar de ficar assim talvez você terá aprendido a gostar de ler”. Isso me lembrou o que a escritora Lygia Bojunga Nunes falou sobre a sua experiência com o primeiro livro que “amou”: “Lá em casa eles me viam tão entregue a esse livro (Reinações de Narizinho), tão quietinha num canto, só eu e o livro, que eles me deram, correndo, uma porção de Lobatos. Eu li; eu experimentei eles todos; eu curti”. Voltei no tempo, lembrei-me menina, lendo Júlio Verne, Monteiro Lobato, José Mauro de Vasconcellos, Maria José Dupré, Mark Twain, o Tarzan, etc... numa atividade insubstituível, sem que deixasse de me divertir com outras coisas como TV, bicicleta, bola, piscina, bonecas, casinhas... Nem precisaria me distanciar tanto no tempo para justificar o prazer da leitura. Hoje em dia continuo tendo, entre as coisas que mais gosto de fazer, a leitura. Até tornei-me mestra em literatura. O exemplo em casa, do valor da leitura, também é uma coisa importante. Se não o exemplo do hábito de leitura constante, coisa que nem todo mundo tem, é importante pelo menos os adultos exemplificarem a valorização do livro, através do incentivo aos filhos que estão na escola, a ler. Achar que os livros são necessários, mas apesar disso não usá-los, ou não recomendar o seu uso, fazem a necessidade vã. Na escola, o professor se encarrega da responsabilidade também pelo exemplo. Professar a leitura é uma das missões dos professores de Língua Portuguesa, disciplina que engloba ensinamentos referentes a língua, comunicação e literatura. As estratégias de incentivo à leitura na escola são muitas. Geralmente são delineadas desde o início por um trabalho de grupo, envolvendo direção da instituição, coordenadores e professores. Essas estratégias se diversificam nas salas de aula, onde cada professor acrescenta outras ações no decorrer dinâmico do ensino e aprendizado. Enfim, a escola deve se esforçar em formar um cidadão que lê. Um exemplo de ação diversificada de leitura que tive oportunidade de colocar em prática, com sucesso, durante o tempo em que fui professora de alunos do ensino médio, foi uma ação baseada no conceito de “biblioteca ideal”. Trata-se de uma estratégia simples, mas eficaz, quanto ao objetivo de aumentar o contato efetivo dos alunos com os livros: ao invés dos alunos lerem todos o mesmo título ao mesmo tempo, cada um lê livros diferentes dos outros, escolhidos por eles mesmos ou determinados pela professora, entre títulos de uma lista (biblioteca virtual) selecionada pela professora. Os títulos são todos disponíveis na própria biblioteca da escola. Dessa forma, além de ler, os alunos trocam informações sobre o que estão lendo e espontaneamente despertam o tema da leitura como assunto que vivenciam. Falam mal, falam bem, indicam, não indicam a leitura, uns para os outros, etc. A idéia dessa ação me surgiu inspirada por Ítalo Calvino em seu livro Por que ler os clássicos. Depois de dar quatorze razões para a leitura de obras clássicas ele diz: “Só nos resta inventar para cada um de nós uma biblioteca ideal de nossos clássicos; e diria que ela deveria incluir uma metade de livros que já lemos e que contaram para nós, e outra de livros que pretendemos ler e pressupomos possam vir a contar. Separando uma seção a ser preenchida pelas surpresas, as descobertas ocasionais”. O que mais me chamou a atenção nessa invenção de Calvino é que a “biblioteca ideal” tem a particularidade de evidenciar o paradoxo do aumento da consciência da ignorância concomitante ao aumento da sabedoria. Traduzindo para a pedagogia a idéia de Calvino, coloquei em prática a biblioteca ideal pela primeira vez depois do comentário de um aluno: “Professora, para que serve ler um livro velho?” Eu respondi: “se um livro dura tanto tempo é porque ele tem um grande valor, por isso muitas vezes os livros mais velhos são os melhores. Se um livro antigo é lido nos dias de hoje é porque seus signos são tão importantes que resistem até mesmo ao tempo.” O aluno ainda não havia compreendido o valor transcendental do livro. O aspecto do objeto-livro, de papel, com capa e folhas novas ou velhas era a sua principal idéia de livro. Numa outra ocasião, outro aluno perguntou para mim referindo-se à proposta de leitura de Os Lusíadas: “Professora, a senhora tem certeza de que vai ser bom para mim, para a minha vida, ler esse livro?”. Respondi a ele nos termos de Calvino, que nos diz o seguinte a respeito dessa questão: “as leituras da juventude (...) podem ser formativas no sentido de que dão uma forma às experiências futuras, fornecendo modelos, recipientes, termos de comparação, esquemas de classificação, escalas de valores, paradigmas de beleza; todas coisas que continuam a valer mesmo que nos recordemos pouco ou nada do livro lido na juventude”. Pode-se citar inúmeros motivos de sustentação do valor da leitura, como o de Thoreau, por exemplo, que defende o acesso aos saberes através do livro como fonte de autonomia política, postura parecida com a de Evando dos Santos, pedreiro de profissão, de origem sergipana, que fundou uma biblioteca na Vila da Penha, o bairro pobre onde mora no Rio de Janeiro, e conseguiu um projeto de Oscar Niemeyer para a construção do prédio de sua biblioteca: “Livro para mim é vida. A leitura traz liberdade para o ser humano”, disse Evando, na época da divulgação, pela grande mídia, da sua iniciativa, há alguns anos. Liberdade, diga-se de passagem, já postulada pelo grande educador Paulo Freire. Outros argumentos frequentes são: aumento do vocabulário, que equivale, mais ou menos, ao aumento dos horizontes do pensamento, pois o homem pensa, em grande parte, através de palavras; manutenção e criação da cultura; ligação estreita com a capacidade de escrever; consequentemente aumento das potencialidades de percepção, expressão e compreensão do mundo como um todo e de suas lógicas. No entanto todos esses argumentos estão relacionados a um fato concreto, a um comportamento específico: a atitude de ler. Minha sugestão para colocar em prática esse comportamento é substituir parte do tempo dedicada às telas do computador e da televisão pelas páginas de um bom livro. Pratiquemos um pouco de solidão e liberdade. Então... comecemos a leitura. #Leitura #Importânciadaleitura #ÍtaloCalvino #Ensinaraler #Educação #Porquelerosclássicos #Katawixi

  • Um fim de semana em Bonito

    Rios de água cristalina, calmos e de temperatura tépida, vegetação aconchegante e convidativa às margens, canto de pássaros exuberantes, peixes dourados… essas coisas lindas e raras, típicas das imagens de um paraíso que possivelmente cultivamos em nossas imaginações, fazem parte do ambiente natural nas cercanias da cidade de Bonito, no Mato Grosso do Sul. Quem chega para visitar Bonito em busca dessas belezas, contudo, logo descobre que elas são todas de propriedade particular - com exceção de dois ou três “atrativos” gerenciados pelo poder público - o que significa que o acesso a qualquer lugar bonito em Bonito é feito mediante o pagamento de taxas, inclusive aos lugares públicos. Atualmente os preços variam de R$ 40,00 a R$ 1.045,00. Mas a maioria dos programas turísticos fica na faixa de R$ 80,00 a R$ 200,00, muitos deles incluindo transporte e refeição. Se por um lado essa questão dos custos parece desanimadora, por outro ela se justifica: Bonito é um dos poucos lugares turísticos do Brasil em que o turismo é extremamente bem organizado, tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista da sustentabilidade ambiental. Do ponto de vista organizacional, as agências que disponibilizam os serviços de guia, transporte, etc., apoiam-se todas em uma agência central, que coordena a regulação de preços e a distribuição de visitantes, o que facilita grandemente as coisas para o turista. E do ponto de vista da sustentabilidade, a quantidade de pessoas, as regras de comportamento, e os horários, em cada passeio, são limitados de acordo com indicadores ecológicos e de segurança, com a finalidade de preservar a relação do ser humano turista com o meio ambiente natural. Uma das coisas lindíssimas que tem por lá é o Rio Formoso. Disseram-me que suas águas são transparentes porque o leito do rio é formado por um material que reflete a luz do sol, composto de restos de conchas de moluscos milenares. Mesmo num dia de bastante chuva, que era o tempo que fazia no dia do nosso passeio, o rio Formoso estava transparente. Primeiramente conhecemos um pouco desse rio a partir do Parque Ecológico do Rio Formoso. O guia nos disse que a área do parque faz parte das terras de um fazendeiro que chegou à conclusão de que era mais vantajoso preservar as florestas e o rio naquela região, e entrar para o ramo do turismo, do que explorar a terra plantando pasto e investindo em gado. Agora o fazendeiro parece que faz as duas coisas. O gado fica na parte menos bonita da fazenda. Melhor para o meio ambiente, melhor para a gente. Esse Parque é realmente maravilhoso. Chegando lá, vestimos os acessórios necessários fornecidos para o passeio: capacetes, calçados específicos e boias. Fazemos uma linda caminhada no meio da mata, conhecendo a vegetação - os guias sabem dizer quais são as espécies - e animais: muitos macacos e pássaros. Fomos acompanhados por uma porca-do-mato, a Chiquinha, bicho de estimação do Parque, que foi adotada por uma cadela quando era bebê. Os guias dizem que ela pensa que é cachorro… Depois dessa caminhada revigorante, escolhemos descer o rio Formoso sentados confortavelmente em grandes boias à guisa de barcos, essa é a atividade nomeada boia-cross. O rio vai nos levando em sua correnteza mansa através de sua paisagem esmeraldina. Em um ponto, podemos parar para nadar um pouco. Após o boia-cross, podíamos ainda andar a cavalo pelo Parque. Não quisemos fazer isso, pois não sabemos montar à cavalo e nem estávamos com ânimo de aprender. Preferimos remar em um dos barquinhos disponíveis no lago do Parque. Após essas alegres atividades, todas feitas na parte da manhã, o restaurante do local serve um almoço delicioso na linha da autêntica culinária sul-matogrossense, ou seja, culinária brasileira no melhor sentido da abundância de cores, aromas e sabores: peixe frito, arroz, feijão, salada, linguiças, pimentas, farofa e doces de goiaba, leite e banana de sobremesa. Se não estivesse chovendo, faríamos na parte da tarde um passeio por entre as copas das árvores: o tal do “arvorismo”. Mas deixaremos para outra vez… Passeamos pela cidade. É bonitinha, toda voltada para o turismo. Restaurantes de todos os tipos, para todos os gostos. Muitas lojas de artesanato e artigos para se levar para casa como lembrança. Os artesanatos são lindos, dos mais bonitos do Brasil, principalmente os indígenas. À noite vamos visitar a fábrica de cachaça e artesanato Taboa. É um lugar bem interessante. Ali desenvolve-se uma técnica artesanal em cerâmica que o turista pode acompanhar em todas as etapas. Vale a pena se deter nas peças produzidas por essa fábrica porque refletem o imaginário e a inventividade autênticos dos artesãos locais e, por conseguinte, simbolizam as marcas da própria região. E ali também se cultiva uma infinidade de ervas que são misturadas à cachaça da marca Taboa. Pode-se experimentar os sabores na visita à fábrica. Segue chovendo. Depois da nossa segunda noite no hotel Arte da Natureza, amanhece um céu cinza, com chuva forte. Tínhamos programado um dia inteiro de caminhada numa trilha bastante extensa, passando por várias cachoeiras. Mas com aquele tempo era impossível fazer isso. Na parte da tarde, com a chuva menos forte, voltamos ao nosso Rio Formoso. Mas agora pelo ângulo da Praia da Figueira. Esse lugar tem esse nome por conta de uma figueira enorme e antiquíssima, que a proprietária vai incentivando se espalhar, colocando apoios para sustentar seus galhos cada vez mais extensos. Embaixo dessa figueira foram colocadas várias redes, e a gente quer ficar ali para sempre, deitado embaixo daquela árvore infinita. Mas a coisa mais fascinante de se fazer por aqui é a “flutuação”. O guia faz você vestir uma roupa daquelas de mergulhador, uma segunda pele, sapatos especiais, boias e snorkels (óculos para a água com respiradouro). Anda-se através da mata até um determinado ponto e mergulha-se no Rio Formoso. Nessa parte do rio, que é bastante calma, você deixa o seu corpo solto, de barriga para baixo, boiando, e olha para baixo: e aí você pode ver dezenas de peixes, grandes e dourados, a maioria deles piracanjubas, naquele momento. Você flutua com o rio, nada com os peixes. A mata em volta é calma, tudo é verde claro. Isso num dia chuvoso. Imagino como será num dia de sol. O rio é relativamente raso e não se pode colocar os pés no leito para não turvar a água. É claro que hoje os peixes são alimentados pelo guia para ficarem por ali, em volta dos turistas. Após a “flutuação”, ficamos mais um pouco ali na Praia da Figueira e vimos vários pássaros diferentes e alguns mamíferos, todos à beira da mata, mas como não havia para quem perguntar os nomes daqueles bichos, não podemos comunicar aqui precisamente quais eram esses animais. Basta porém dizer que causa um maravilhamento inédito depararmo-nos com seres que nunca se viu antes. A nossa estada em Bonito foi de apenas um final de semana. Mas para aproveitar bem mesmo Bonito é necessário ficar pelo menos sete dias. Há grutas, lagoas, abismos, nascentes, trilhas, cachoeiras, que poderíamos ter conhecido se ficássemos mais tempo. Para chegar lá nós fomos de avião, de São Paulo até Campo Grande, e depois pegamos um ônibus para Bonito. A viagem de avião é de uma hora mais ou menos, e a de ônibus, umas duas horas. Porém descobrimos que pode ser vantajoso alugar um carro em Campo Grande, pois em Bonito, para fazer os passeios, você tem que pegar táxi para te levar até às portarias dos locais turísticos, que são todos na zona rural. Outra alternativa é alugar um carro apenas em Bonito. Porém o ônibus de Campo Grande para Bonito é bem mal cuidado. E por fim, fica a dica: se você for a Bonito, não deixe de curtir um pouco também Campo Grande. A capital do Mato Grosso do Sul é uma cidade bonita, limpa e calma. Para saber maiores detalhes sobre bonito, entre no site da Atratur: www.atrativosbonito.com.br #Bonito #MatoGrossodoSul #Atratur #RioFormoso #ParquedoRioFormoso #PraiadaFigueira #CachaçaTaboa #ArtesanatoTaboa #Encantos #Katawixi

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    SÉRIE DE FOTOS DE WALTER ANTUNES Trata do encontro intensamente procurado ou descoberto (casualmente?). Trata do encontro do olho com a lente, da imagem fotografada com tudo aquilo que está ao seu redor. Trata do raro encontro da visão com o olfato, do tato com a audição, do humano com aquilo que nos condicionamos a chamar de sobre-humano. Quando através da procura chega-se ao momento real e extremamente sutil em que tudo soa único como o círculo que se inicia e em si mesmo se completa. Nesse momento já não há mais olho, não há mais lente e todos os sentidos estão unidos como um feixe de luz num canal de percepção integral. #WalterAntunes #ExposiçãoUníssono #Uníssono #FotosdeWalterAntunes #PaisagensBrasileiras #Katawixi

Katawixi é um lugar de crítica,
análise e divulgação de pensamentos, pontos de vista filosóficos, práticas
e produtos culturais, livres de vínculos institucionais, 
concebido por
Luama Socio e Walter Antunes.
 
Katawixi é antes de tudo o nome de um povo que flutua agora em algum lugar na Amazônia.
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