Fátima Barros
- Katawixi

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Fátima Barros, uma e todas as vozes: ni perdón, ni olvido
“No hay palabra que no sea portadora de una inminente resurrección”, afirma o autor Carlos Fuentes em En esto creo (2002).
Essas palavras me acompanham agora ao pensar e escrever essas linhas sobre Fátima Barros. Morta aos 48 anos em 2021 pela necropolítica do então governo da época acerca da covid, a pedagoga, liderança e ativista quilombola completa aniversário agora em outubro, dia 22, não nos esquecemos.
Lembro-me que a conheci em 2019 durante visita à Ilha de São Vicente.
Lembro-me igualmente o quão impactada e emocionada fiquei na presença daquela mulher potência, mulher força da natureza, mulher plural, que sendo uma amplificava a voz de uma multidão de histórias silenciadas pela ainda
impune violência da História.
No romance La mujer habitada (1988), da escritora nicaraguense Gioconda
Belli, a indígena Itzá, assassinada durante a colonização espanhola, e a
personagem Lavinia, reprimida durante regime ditatorial, alinhadas em espírito, logram reparação histórica ao “derrubar” o general, “aquel hombre, como los capitanes invasores: su cara esculpida de dios maligno” (1988, p. 395).
Essa cena da narrativa da autora nicaraguense me faz lembrar o que certa vez a líder quilombola destacou acerca da morte: “Para o povo Bantu a relação com a morte é diferente da relação que a sociedade comum brasileira tem. Os bantus acreditam que as pessoas continuam existindo nos seus espaços, no seu território, mesmo depois da morte”.
Certa estou, ao pensar nessas palavras de Fátima, que ela segue presente em seu território e vive em cada esperançar, em cada ato de justiça, sua
voz se faz ouvir por meio de inúmeras outras, como a minha. Todas bradamos por reparação histórica, pois o capitão impiedoso e maligno, que zomba da doença e da morte alheias, continua impune.
Por isso, que se ecoe: Não perdoaremos! Não esqueceremos!
Fátima Barros presente: ontem, hoje e sempre!
Sin perdón, ni olvido.
Daniele Zaratin
Professora
Sertão pernambucano, 2025

Maria de Fátima
Aquela menina, mulher, Maria.
De horas tantas, força sonhadora
De um olhar sorriso, daqueles mesmo que acolhe
De uma voz que ecoa, ressoa, reluz
Dessas assim que traduz
Um dia até me disse em palavras de cor, tensões, ternura, fervor
De sentidos vivos, internos, ruídos, imersos
A que canta, diz, sonha, planta e encanta
No ato, no antro, no outro, em luz
Pomar da vida
O que me diz, Maria?
Maria de quê?
Das horas? Da Força? Da Luz? Da revolta? Do Lutar? Do brincar? Do dizer?
A menina, mulher, Maria.
Que diz: A gente!
Que embrulhou em braços, embrulha, que nos viveu em canto, canta.
Que sorriu, reluziu em flor.
Talvez sejamos, Maria!
Esse traço de força, fúria e fervor
Tu foi, tu é.
Amiga, Maria, Amor!
Léo Daniel da Conceição Silva
Imperatriz, Maranhão

As Duas Fátimas
Eu me recordo de duas Fátimas.
A primeira era a Fátima do sorriso fácil, da presença acolhedora, sempre disposta a receber quem a procurasse com um abraço sincero, independentemente do momento. Foi essa Fátima que, mesmo após uma viagem exaustiva a Palmas, atendeu a minha ligação, conversou comigo por longos cinquenta minutos e, com generosidade, se dispôs a colaborar com minha pesquisa de mestrado.
Seu sorriso tinha o dom de atravessar o telefone; irradiava luz, afeto e serenidade. Assim, ela me conquistou.
A segunda Fátima eu conheci no território da Ilha de São Vicente, seu lugar, seu chão. Ali, vi emergir uma mulher de força ancestral. Colocou o turbante colorido, pediu licença aos que vieram antes e, de súbito, ergueu-se como uma voz firme e altiva. Falava para encantar, para convencer, para mover corações. Falava em nome da luta, da dignidade e da defesa do seu povo.
Essa segunda Fátima era uma guerreira incomparável. Dela, guardo a lembrança mais viva e comovente: a força da sua voz, uma força que ainda ecoa, mesmo na ausência.
Alex Montel
Araguatins, Tocantins

Fátima: como o vento de oya
Fátima, amiga e doce guerreira
como o vento de oya
limpava o caminho das maldades
e ganância do latifúndio
no campo e na cidade
voz forte
como um trovão
que do orum nos ilumina
para seguir firmes na luta
pela libertação coletiva
de nosso Povo
Onir Araújo
Frente Quilombola RS
Porto Alegre, Rio Grande do Sul

Fátima Barros, filha de Seo Cantídio e dona Vicença
Fátima Barros, filha de sr. Cantídio e dona Vicença, lá do Centro do Jacob, cresceu cercada de carinho, histórias e cantigas entre os pais e irmãos.
Nunca se conformou com o pouco.
Ainda adolescente, saiu de Araguatins, levando consigo não apenas sonhos, mas a determinação de transformar vidas, de abrir caminhos e de inspirar todos ao seu redor.
Fátima Barros atravessou fronteiras com coragem e determinação, carregando a história de seu povo e a esperança de dias mais justos
Como professora, ela não apenas ensinava, mas inspirava. Cada aula sua foi um ato de amor e transformação. Foram sementes plantadas nos corações de seus alunos. Fátima sempre acreditou no poder da educação como ferramenta de libertação.
Acreditava na força da união, da resistência e do conhecimento como ferramentas para mudar o mundo
Como mulher quilombola, Fátima Barros foi a representação da força ancestral. Sua voz ecoava as histórias de luta e resiliência de seus antepassados, e sua presença sempre foi um lembrete vivo de que a resistência é um ato de amor. Fátima nos ensinou a valorizar nossas raízes, a lutar com dignidade e a nunca desistir.
Hoje, 22 de outubro, dia do seu 53º aniversário, era um daqueles dias de comemorarmos seu aniversário. Mas talvez você estivesse em Brasília, no Centro do Jacob, em Goiânia, em São Paulo ou quem sabe, até em Moçambique.
Relembro o quanto sua presença era marcante, seja pelas suas vestes de cores vibrantes, voz alta ou sorriso farto, você falava dos projetos, das lutas, mas também dos medos.
É, amiga... sua uma jornada foi curta, mas seu legado será eterno. Você continua viva em nossas memórias, em cada sorriso que provocou, em cada vida que tocou.
Sua luta pelo movimento, pela igualdade e pela educação nunca será esquecida.
Você será sempre lembrada como uma guerreira, uma mulher de fibra que nunca se calou diante das injustiças.
Até um dia!
Lucinalva Ferreira
em 22/10/2025
Araguatins, Tocantins
links:
Histórias de Vida da Comunidade Quilombola Ilha de São Vicente no Rio Araguaia
Alexsandro de Souza e Silva
Exposição de fotos de Walter Antunes

fotos e vídeos: Walter Antunes




