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  • Luama Socio: texto, Walter Antunes: fotos

Ouro Preto dos poetas, das sombras e da juventude


Quem vai a Ouro Preto se impressiona definitivamente com as sombras concretas do passado brasileiro há alguns séculos de distância, conservado em monumento histórico feito de uma cidade inteira.

Não é como outros lugares, em que a história é vista aqui e ali a conta-gotas, não, em Ouro Preto você caminha, respira, habita dentro da história. Os casarões, as igrejas e os muros projetam as sombras do passado e o viajante navega entre essas projeções como se tivesse realmente voltado no tempo da história, mais precisamente ao Século XVIII.

Curiosamente é também uma cidade de muita juventude: cheia de estudantes morando nos casarões transformados em repúblicas há décadas. Essas moradias estudantis são mantidas por confrarias tradicionalíssimas formadas pelos eternos e fiéis ex-estudantes que recepcionam os novos a cada ano. Isso mantém a cidade em constante clima de festa e irreverência.

Ouro Preto, além de ser uma cidade, também pode ser considerada um poema em forma de casarões, igrejas e ladeiras. Um poema que é cantado por tantos poetas desde que o lugar existe, desde Tomás Antônio Gonzaga passando por Cecília Meireles, Vinícius de Moraes e tantos outros, famosos ou anônimos.

Em 1950 o poeta Murilo Mendes vê Ouro Preto e escreve a série de poemas intitulada Contemplação de Ouro Preto. Sua visão capta desde as imagens sombrias até as luminosas, vai da morte à vida, do pesado ao leve:

Ruínas de solares e sobrados

Onde pairam espectros de poetas,

De padres doidos, de reformadores

O canto alternativo das igrejas

Nos leves sinos da levitação

Cruzando-se em cerrado contraponto,

São Francisco de Assis adverte ao Carmo,

São Francisco de Paula à matriz do Pilar.

(in: Motivos de Ouro Preto)

(...)

Em sua contemplação, Murilo Mendes toca a atmosfera histórica, a religião, a arquitetura, a arte, as figuras e personagens populares e as de renome ligadas à cidade: Aleijadinho, Joaquim José, dona Adelaide…

O passeio do poeta naquela época coincide exatamente com o nosso passeio de agora, quando estamos lá em visita:

Tu, Ouro Preto,

Que outrora foste

E agora inda és.

De qualquer ângulo

Tu sempre és bela!

De qualquer ângulo

Ao olho amante

Sempre és igual.

(in: Romance de Ouro Preto)

(...)

Minha alma sobe ladeiras,

Minha alma desce ladeiras

Com uma candeia na mão,

Procurando nas igrejas

Da cidade e do sertão

O gênio das Minas Gerais

(in: Romance das Igrejas de Minas)

Eu vi a cidade barroca

Vivendo da luz do céu

(in: Flores de Ouro Preto)

Murilo Mendes dedica ao arquiteto Lúcio Costa - que projetou Brasília junto com Niemeyer - um poema sobre a fantástica, singela e belíssima igreja de São Francisco:


Solta, suspensa no espaço,

Clara vitória da forma

E de humana geometria

Inventando um molde abstrato;

Ao mesmo tempo, segura,

Recriada na razão,

Em número, peso, medida

(in: São Francisco de Assis de Ouro Preto)

O poeta fala também das luminárias e da lua, que tanto se destacam ao observador que passeia à noite pela cidade:

Em Ouro Preto

- Viva a sua luz-

Vi luminárias

Dependuradas,

Vi luminárias

Que a mão conduz,

Vi luminárias

Verdes, vermelhas,

Vi luminárias

Roxas, azuis.

(in: Luminárias de Ouro Preto)

No Carmo lua:

Que lua grande,

Corpo estendido,

Lua longueira…

Mas que luarão

Nesses retângulos

Que o Carmo tem!

O Carmo é mesmo

Todo um luar.

(in “A lua de Ouro Preto”)


E afinal, a cidade de Ouro Preto, hoje, é um lugar extremamente acessível e confortável ao viajante. Totalmente equipada com a infraestrutura padrão dos lugares turísticos. Há hotéis, restaurantes, museus, eventos e passeios para todos os públicos.

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